Alzira Fragoso

Algumas palavras sobre o meu trabalho

A minha poética é tecida pelo tempo; um tempo-sem-tempo no qual passado e presente se misturam, amalgamando memórias antigas, vivências presentes, sonhos, fantasias. Memórias do corpo – memórias da alma.

A tradição francesa do toile de jouy, estamparia em que cenas campestres são reproduzidas e repetidas, e a pintura oriental, na qual instantâneos do cotidiano vão percorrendo a obra, têm sido fontes de observação.

Venho desenvolvendo um trabalho que enfatiza a repetição de ações, com variação de motivos, criando um ritmo, um elo entre pintura–música–literatura e pequenos textos–poemas inspirados em canções, haikais, trazendo ao trabalho uma espécie de mantra.

A busca de simplicidade e liberdade de expressão contida, que intensifica a vibração da obra, conduz-me a ouvir JOBIM que, com a repetição de sons em variações sutis e delicadas, traz um norte à minha busca de síntese.

Uma paisagem em movimento, ora saturada, ora vazia, com árvores, frutos, flores, pássaros, dão ênfase à pequenez da figura humana.

O patchwork de imagem, ora do mundo infantil, familiar, ancestral, ora com cenas presentes, de ausência, amor, solidão, dor, incompreensão, compõe o meu expressionismo poético.

Não trabalho com o tempo cronológico, nem com o espaço real, e, sim, com a memória desse tempo e desse espaço, fazendo com que tudo aconteça simultaneamente, quase um diário visual.

Elegi como suportes o mármore–eterno e a lona de algodão, material simples e antigo trabalhado com colagens de organza de seda e rendas, criando superposições e dando relevo à obra. É o fazer que me interessa, o uso das mãos, o exercício da minha criação, as marcas da minha alma.

Busco condensar meu universo em composições plásticas, ressaltando a forma, o movimento e o jogo literário, criando um ritmo, tentando seduzir o espectador para que ele se sinta imerso na obra.

Alzira Fragoso